Série Reforma 500 anos # 2



Reformadores antes da Reforma- John Wycliffe[1]

John Wycliffe, nasceu por volta de 1320. Era de uma família rica de Hipswell, no condado de Yorkshire, Inglaterra. Começou sua vida acadêmica cedo, indo estudar no Balliol College, na Universidade de Oxford. Como nos informa o Pastor Franklin Ferreira (2014, p.132).

Oxford já era considerada por muitos como a principal universidade da Europa e Wycliffe era aluno de Oxford desde aproximadamente 1345. Todavia, na universidade de Oxford lecionava um erudito em Bíblia chamado Thomas Brandwardine. Segundo Pastor Franklin Ferreira Brandwardine estava terminando sua carreira ao mesmo tempo em que Wycliffe começava a sua. Brandwardine mais tarde veio a ser arcebispo de Canterbury e exerceu uma profunda influência sobre Wycliffe que, por sua vez, não parou de estudar teologia. John Wycliffe se tornou mestre do Colégio Balliol, de Oxford aproximadamente no ano de 1354.

Em seguida, no ano de 1361, Wycliffe aceitou o ofício de pastor e um salário atribuído a ele, mas de acordo com o autor Franklin Ferreira ele não cumpriu com suas obrigações. O que possibilitou que ele continuasse sua carreira acadêmica no Balliol College, recebendo assim o doutorado em algum tempo entre 1371 a 1372[2].

De acordo com Gonzalez (2011, p.487), “A maior parte da sua vida transcorreu na Universidade de Oxford, onde ele chegou a ser famoso por sua lógica erudição. Revelou-se como homem dotado de mente privilegiada disposto a ater-se aos seus argumentos até as últimas consequências, e carente de humor. Um dos seus seguidores testemunha acerca disso, contando que, anos depois, o arcebispo de Cantuária lhe disse que, na sua opinião, Wycliffe era “um grande erudito, e muitos o consideravam um perfeito excêntrico”. 

O teólogo e filósofo John Wycliffe saiu da universidade de Oxford entre 1371 e 1372, para se colocar a serviço da Coroa. Porém o pano de fundo político não era favorável, havia uma tensão entre o trono inglês e o pontificado romano, o motivo era a cobrança de impostos que ambas as partes tentavam cobrar da outra. Wycliffe saiu em defesa da Coroa atacando a teoria que dizia que o poder temporal se deriva do espiritual. Segundo o historiador Justo Gonzales, dentro desse contexto, ele começou a desenvolver suas teorias do “senhorio”[3].

Além disso, à medida que sua doutrina sobre o “senhorio”[4] se desenvolvia pelos estudos de Wycliffe, seus escritos não só atacavam o papa e os poderosos senhores da igreja, mas também o Estado. Dessa forma, aqueles nobres que outrora apoiavam Wycliffe foram se separando dele. Com isso, John Wycliffe começou a ficar cada vez mais solitário.

John Wycliffe tinha muitos seguidores e admiradores na amada Oxford, entretanto com o passar do tempo foi diminuindo seus discípulos e também o cerco foi se fechando para “a estrela da manhã da Reforma”. Um dos temas que foi o estopim para a explosão de debates e ânimos acalorados foi sua doutrina sobre a ceia do Senhor que se opunha aos ensinos oficiais da Igreja Romana.

Em adição, o que deixava John Wycliffe indignado, segundo H.H. Muirhead, eram os meios de explorarem os pobres, em benefício de dignitários[5] estrangeiros. O mercantilismo ganancioso do papado trazia desprezo ao douto de Oxford. Nesse tempo eram muito populares os frades mendicantes[6] que percorriam a nação, extorquindo o dinheiro do povo. A primeira contenda publica de Wycliffe foi com um desses frades, na Universidade de Oxford. De início teve a proteção do arcebispo, contudo este morreu logo.

Em 1377 segundo nos informa Ferreira (2014, p.135), o Papa Gregório XI condenou John Wycliffe por seus ensinamentos e pediu a Universidade de Oxford que o demitisse, instigado pelo arcebispo de Cantuária, o reitor Simon Sudbury. Simon convocou uma assembleia para discutir os ensinos de Wycliffe sobre ceia, onde ele foi condenado por uma estreita margem de votos.

Por outro lado, se muitos queriam calar o erudito cristão, outros queriam ler seus escritos e ouvir John Wycliffe, o que deixava a cúria romana mais irada. Além disso, como tentativa de impedir tudo o que Wycliffe escrevia, seus adversários levaram às últimas consequências, a ponto de seus escritos serem banidos em Oxford, entretanto dada a forte resistência daqueles que gostavam e admiravam o valoroso campeão da verdade de Deus, as autoridades não se atreviam a tomar atitudes contra ele, como nos informa Franklin Ferreira (2014, p.135).

Desta forma, a situação do sábio Wycliffe foi se agravando e ficou ainda mais complicada com a chegada de um novo arcebispo de Cantuária, William Courteney. O experiente e culto Wycliffe toma a decisão de se retirar para a igreja paroquial de Lutterworth que fica perto de Rugby, em 1382[7].
Depois de se retirar e ir para sua paróquia, o teólogo John Wycliffe enfatizou a autoridade das Escrituras, em detrimento da autoridade do papa e das tradições eclesiásticas. H. Bettenson na sua obra Documentos da Igreja Cristã diz:
“Os pontos mais importantes de seu ensino eram: a teoria do ‘domínio pela graça’- supremacia tanto espiritual como temporal provinha diretamente de Deus, em oposição à concepção feudal de derivação através de intermediários, que encontrava seu paralelo na concepção da graça que vinha através do papa e da hierarquia e que tanto influenciou a teologia católica-; a aceitação da Bíblia como única regra de fé e interpretada sem qualquer perspectiva histórica; sua doutrina a respeito dos sangramentos e especialmente da missa...”[8]
Dentro desta ótica, o crítico da igreja romana, a saber, Wycliffe, afirmava que as Escrituras contêm tudo que é necessário para a salvação, sem qualquer necessidade de tradições adicionais:

“As ‘Sagradas Escrituras’ são a suprema autoridade para todo cristão e o padrão de fé e toda a perfeição humana”[9].

Esse santo homem, como é referido por John Fox em sua obra: O Livro dos Mártires, não parou de produzir para glória de Deus. Para deixar a cúria romana insana e prevalecer em seu combate contra a autoridade abusiva da igreja papista, seu projeto foi tornar a Bíblia acessível às pessoas em sua própria língua.[10]  Em 1382 Wycliffe ataca a autoridade do papa, dizendo num livro que Jesus Cristo, e não o papa, era o cabeça da igreja. Afirmou também que a Escritura, e não a Igreja, era a autoridade única para o crente (Franklin Ferreira, 2014, p 136).

Ademais, este pensamento de tornar disponível a Bíblia para povo não ficou somente na cabeça de Wycliffe, esse servo do Senhor traduziu e supervisionou Bíblias para o inglês médio, a partir da Vulgata Latina. Estas traduções bíblicas foram a causa inspiradora do movimento pré-Reforma Protestante dos Lolardos, que rejeitava muitos dos ensinamentos da Igreja Católica.

Segundo o Dr. David Baele professor da  Church History e Bible Bob Jones University (Universidade da Bíblia Bob Jones)[11] e John Fox em sua obra: O Livro dos Mártires, Wycliffe morreu dois anos após o lançamento de sua bíblia. A causa morte foi um derrame.
 Com o passar dos anos ele foi condenado, mesmo depois de morto, como herege, e seus seguidores foram perseguidos e sua bíblia foi condenada e ninguém a publicava. No Sínodo de Constança em 1415 seus livros foram queimados, mas como nos relata Dr. Baele não só os livros de Wycliffe, mas os restos mortais do eminente teólogo. E assim John Wycliffe teve seu corpo exumado anos depois de seu sepultamento, seus restos mortais foram queimados e suas cinzas foram jogadas no rio Swift.

Franklin Ferreira declara que as autoridades pensaram que, ao queimar os restos mortais, poderiam apagar o legado de Wycliffe. Mas tais ações não seriam capazes de saciar a fome da Palavra de Deus.[12]

Por Georgington de Souza Ribeiro
Revisão: Thalyta Priswa 

Crédito da foto: Reprodução/Google



[1] Subtítulo tirado do Livro O Cristianismo Através dos Séculos de H.H. Muirhead, Editora Casa Publicadora Batista, Rio de Janeiro 1959 Volume I 4° edição p.315

[2] Ferreira, Franklin, Servos de Deus: Espiritualidade e teologia na história da igreja/Franklin Ferreira-São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 2014, p.132
[3] Gonzales,Justo L.- Historia ilustrada do cristianismo: a era mártires até a era dos sonhos frustrados/Justo L. Gonzales; tradução Hans Udo Fuchs, Key Yuasa. 2.ed.rev. com roteiro de leitura.- São Paulo: Vida Nova, 2011, p.487
[4] “senhorio”. Em que se consiste em o senhorio legitimo? Quais são suas origens? Como é reconhecido? Em resposta a essas perguntas Wycliffe declara que não há outro senhorio além do de Deus. Qualquer pessoa tem domínio ou senhorio falso e ilegal, puramente humano. Este é usurpação, em vez de ser senhorio verdadeiro. A Bíblia nos fornece um critério claro para distinguir entre dois: Jesus Cristo, a quem pertence todo domínio, não veio para ser servido, mas para servir.  Gonzales,Justo L.- Historia ilustrada do cristianismo: a era mártires até a era dos sonhos frustrados/Justo L. Gonzales; tradução Hans Udo Fuchs, Key Yuasa. 2.ed.rev. com roteiro de leitura.- São Paulo: Vida Nova, 2011, p.489
[5] Pessoa que exerce um alto cargo ou goza de um título proeminente.
[6] Mendicantes é o plural de mendicante. O mesmo que: mendigos, pedintes, pobres
[7] Ferreira, Franklin, Servos de Deus: Espiritualidade e teologia na história da igreja/Franklin Ferreira-São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 2014, p.136

[8] Bettenson, Henry Documentos da Igreja Cristã/Henry Bettenson- São Paulo: Aste, 2007 p.265 
[9] Ferreira, Franklin, Servos de Deus: Espiritualidade e teologia na história da igreja/Franklin Ferreira-São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 2014, p.136
[10] Fox, John, O livro dos Mártires / John Fox; tradução de Almiro Pizetta.- São Paulo: Mundo Cristão,2005, p.55
[11] Documentários: Série A Chama Flamejante parte 1- Family Christian Movies.com- In Association With Ambassador Productions. https://www.youtube.com/watch?v=4Lc2Xj81yRQ
[12] Ferreira, Franklin, Servos de Deus: Espiritualidade e teologia na história da igreja/Franklin Ferreira-São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 2014, p.139

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